sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Desfile em carro aberto

A delegação brasileira no Parapan conquistou o bicampeonato no quadro geral de medalhas este ano. Só os atletas da Associação Niteroiense dos Deficientes Físicos (Andef), conquistaram 14 em Guadalajara.

No halterofilismo, Alexandre Gouveia levantou 132kg, garantindo medalha de bronze na categoria entre 48 e 56kg | Foto: Divulgação
Para comemorar, os atletas da Andef vão percorrer as ruas de Niterói no caminhão aberto do Corpo de Bombeiros na próxima quinta-feira (1º/12). A saída será da sede da entidade, no Rio do Ouro, às 14h. O trajeto será feito pelas principais ruas da cidade até a chegada à Câmara Municipal da cidade, na Avenida Ernani do Amaral Peixoto.

Quem é de Niterói e/ou estiver de bobeira, vale dar um pulo lá para homenagear nossos atletas! Até porque, eles foram bem melhores que a outra delegação brasileira no Pan, né...

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Livros independentes

Gosto muito de produção cultural feita de forma independente. Aquela galera que se vira pra publicar seu próprio livro, pra gravar sua música, fazer seu curta-metragem etc. Estes sempre podem contar comigo pra dar um apoio que, da forma que puder, vou tentar ajudar.

Gosto muito também de eventos que incentivam este tipo de produção cultural. Festival de cinema, de música, feira literária e tudo o mais. Novamente, sempre vou ajudar a divulgar os que me pedirem ajuda.

Pois bem, para cumprir minha recém-formulada promessa, vou falar sobre a 11ª edição Primavera dos Livros, que começou nesta quinta e vai até domingo (27) no Museu da República, no Catete.

Foto: Divulgação.
A Primavera dos Livros é o maior encontro de editoras independentes do país. Nele, serão realizadas várias atividades, como debates e lançamentos de livros. A escritora Heloísa Buarque de Hollanda será a homenageada desta edição.

A programação completa, você pode ver aqui. Mas gostaria de destacar algumas atividades que chamaram mais a minha atenção.

Nesta sexta (25),  às 13h, o coleguinha Osvaldo Maneschy lança o livro Leonel Brizola - a legalidade e outros pensamentos conclusivos, produzido sob sua organização e publicado pela editora Nitpress. Maneschy é jornalista e, atualmente, ocupa a Secretaria Municipal de Trabalho em Niterói. Tive oportunidade de conversar algumas vezes e, em todas as nossas conversas ele mostrou ser uma pessoa extremamente inteligente, o que torna seu livro é uma promessa de boa leitura.

No sábado (26), o cantor e compositor Martinho da Vila participa de uma mesa redonda, às 18h, com o título “Afrodescendências: nossas heranças”. Acredito que este será um dos pontos altos do evento, assim como a homenagem à Heloísa Buarque de Hollanda, que acontece um pouco depois, às 19h30. Também no sábado, o coleguinha Luiz Antônio Mello, da Coluna do LAM, também faz seu lançamento. O Manual de sobrevivência na selva do jornalismo (Nitpress), será lançado às 11h.

Trata-se de um evento gratuito, onde muitas trocas produtivas poderão ser realizadas. Este promete ser um bom espaço para trocar ideias e conhecer bons autores que estão fora das estantes das mega stores.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Os caracteres da velhice

Aristóteles descreve, no segundo livro da Retórica, as características dos idosos. São “desconfiados, devido à sua experiência”; “amam a vida, sobretudo nos seus últimos dias, porque o desejo busca o que lhes falta e o que lhe faz falta é justamente o que mais se deseja”; “são pessimistas”; “em tudo vêem um mal que os ameaça”...

Chico Buarque parece ter lido com bastante atenção a Retórica de Aristóteles, já que é basicamente este o clima do seu romance Leite Derramado.

Lendo este livro – que eu ganhei no início do ano, mas só tive tempo de pegar para ler agora – eu consegui entender porque ele foi tão premiado. Não é para menos: o livro é sensacional, tanto na forma em que ele se apresenta quanto no conteúdo apresentado.

Leite Derramado presenteia o leitor com a história de um homem de 100 anos, no leito de um hospital, narrando suas memórias. Em alguns momentos, quem anota o que o velho Eulálio está dizendo é uma enfermeira. Em outros, é a filha. O interlocutor muda de figura o tempo todo e, constantemente, o narrador se dirige a este interlocutor: “Bom dia, flor do dia, mas deve haver modos menos agourentos de se despertar que com uma filha choramingando à cabeceira”, diz no início de um capítulo. “Lá vem você com a seringa, é melhor dormir, tome meu braço”, diz, encerrando outro.

O mais interessante é a intensidade com que o autor, que tem 67 anos, imerge na mentalidade de um homem de 100 anos e pinta toda a história com as cores de uma pessoa com a idade já bem mais avançada. O narrador confunde personagens em um momento; em outros, diz que vai chamar os próprios pais, que já estão falecidos; conta a mesma história mais de uma vez em um curto período de tempo.

Em suma, é um livro de leitura rápida, mas que requer bastante atenção – principalmente ao nome dos personagens, pois o leitor mais distraído pode acabar cometendo confusões. Sua linguagem é simples e direta, mas a narrativa, até por se tratar de um livro de memórias, é toda em tempo psicológico. Não há respeito a uma cronologia muito estrita. Destaque para o modo como o Rio de Janeiro é descrito nas entrelinhas e para o fato de que tudo que é mais precioso para este narrador se despede aos poucos dele com o passar dos anos. Uma excelente reflexão sobre o fim e os fins da vida.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Parece sacanagem

O post de hoje é basicamente sobre o vídeo do Lobão, em que ele fala sobre a pendenga com o festival Lollapalooza. Gostaria de fazer algumas anotações, não só sobre este episódio, mas sobre a situação da música brasileira frente a estes festivais.

Segundo o Lobão fala no vídeo, ele teria sido convidado para se apresentar no festival, mas recusou o convite porque os organizadores queriam que os artistas brasileiros tocassem das 10h às 15h, enquanto os estrangeiros tocariam após este horário. Após o músico colocar a boca no trombone denunciando a atitude do festival, os organizadores teriam mudado o critério de organização do line up, desmentindo o Lobão.

A mim, não interessa quem está certo e qual é a versão verdadeira desta história toda. Interessa o seguinte: não dá mais para artistas brasileiros ficarem sendo colocados em um segundo plano para agradar produtores de festivais internacionais. Já fiz um post falando sobre isso na ocasião do Rock in Rio e repito aqui o mesmo discurso.

Mesmo que o artista que venha a fechar a noite seja estrangeiro, por que colocar os brasileiros somente como bandas de abertura? Por que não colocar artistas brasileiros que têm anos de estrada e inúmeros hits para tocar mais tarde, em um horário que o festival esteja mais cheio?

Em 2010 eu fui ao Planeta Terra. Fui porque queria ver o show do Mika. Mas também queria ver o que as outras bandas iriam apresentar. Cheguei bem depois dos portões estarem abertos e fiquei bastante indignado quando constatei que algumas bandas brasileiras já tinham acabado de tocar quando eu consegui entrar. Resultado: perdi algumas apresentações brazucas, mas vi todas as internacionais.

Parece que é feito de sacanagem. E é.

Poderia ficar aqui citando inúmeros exemplos, mas é melhor deixar o vídeo falar por conta própria:

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Sobre festivais e indústria de cigarro

Há algum tempo venho pensando na proibição de indústrias de cigarros patrocinarem eventos culturais – principalmente festivais de música. Mas duas notícias que eu li nos últimos dias me motivaram a escrever este post.

A primeira fala sobre os rendimentos bilionários da indústria de cigarro no Brasil, que apresenta crescimento, apesar da redução no número de fumantes e das leis antifumo. A outra, diz respeito a uma possível alteração na legislação em vigor, permitindo que fabricantes de cigarro voltem a patrocinar eventos.

Como bem destaca a segunda matéria, os fabricantes de cigarros já foram responsáveis por grandes eventos no Brasil, como o Free Jazz Festival, o Hollywood Rock, o Carlton Dance, só para citar os festivais de música. Isso sem contar torneios esportivos, peças de teatro, dentre outros tipos de eventos.

Ok, também sou contrário ao patrocínio de eventos esportivos por parte de fabricantes de cigarro, afinal, esporte é saúde e o cigarro está no extremo oposto. Mas por que não permitir que tais empresas patrocinarem ou organizarem festivais de música?

Vimos, nos festivais mais recentes, bandas se estapeando em busca de espaço para tocar, produtores cometendo verdadeiras injustiças na montagem do set list, ingressos algumas vezes mais caros do que muitos fãs poderiam pagar. Por outro lado, vemos um setor industrial com um faturamento bastante elevado, mas impedido de investir em festivais de música em nome de um suposto combate ao tabagismo.

Deixando de lado os aspectos legais da MP que altera a legislação do tabaco, acho bem fraco este argumento de que um evento patrocinado por companhias de cigarro poderia servir como um incentivo ao hábito de fumar. Tudo bem que a propaganda seduz e pode incentivar o consumo. Que se proíba a propaganda então e deixem as empresas fazerem festivais!

Não consigo acreditar que uma pessoa vá começar a fumar só porque foi a um Hollywood Rock, por exemplo. Principalmente porque, caso a nova legislação entre em vigor, a marca do produto não ficará exposta, e sim o nome da empresa.

Já pensou um Philip Music Morris, com os maiores nomes da música nacional e internacional a um preço que você pode pagar? Sim, porque com o retorno institucional do evento, a empresa pode reduzir sua margem de lucro com o festival e ainda assim sair ganhando.

Mais do que a aprovação da MP – que também restringe ainda mais o fumo em locais públicos –, acho particularmente interessante que este debate tenha voltado à tona. Principalmente em um ano que teve Rock in Rio, SWU, Planeta Terra...


P.s.: Sou contrário à proibição da propaganda nos pontos de venda, outro ponto incluído na MP. Mas isso fica para outra discussão...

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Uma fofura só

Todo mundo sabe que eu não sou do tipo que adora criancinhas. Mas alguns filmes com crianças como protagonistas me tocaram o coração. Primeiro foi A culpa é do Fidel de Julie Gavras (2006), que tem a pequena Nina Kervel-Bey no papel principal. Mais recentemente tive contato com outro filme pelo qual fiquei logo apaixonado: O pequeno Nicolau (Laurent Tirard, 2009).

O filme mostra o pequeno Nicolau (Maxime Godart) tentando lutar contra a chegada de um irmãozinho mais novo, devido ao medo de ser preterido pela família. Com toda sutileza que o tema exige, o filme explora o universo infantil com grande propriedade e nos faz rir de uma forma honesta e despretensiosa: longe de qualquer pastelão e de piadas clichê.

O pequeno Nicolau explora um recurso cômico já bastante utilizado tanto na literatura quanto no cinema: o quiproquó. Mesmo assim, ele não perde em nada por isso.

Segundo a definição do dicionário, o quiproquó é um “erro que consiste em tomar uma coisa por outra”. E é exatamente esta a deixa para praticamente todas as cenas cômicas do filme: o desentendimento nos diálogos, gerando confusão entre os personagens.

No todo, o filme é muito bom, com fortes atuações, principalmente por parte das crianças. É uma boa pedida para reunir toda a família em torno de um pote de pipoca num domingo à tarde.

domingo, 13 de novembro de 2011

O lado ruim da expectativa

Desde que foi lançado, eu li diversas resenhas críticas a Cisne Negro (Darren Aronofsky, 2010), mas só agora consegui parar pra assistir ao filme. De fato, ele é muito bom, mas ficou aquém do palavrório.

O filme trata da perturbação psicológica da protagonista, a bailarina Nina (Natalie Prtoman), que está prestes a se tornar a solista principal do próximo espetáculo de sua companhia – O Lago dos Cisnes. Paralelamente a isso, Nina tem relações conturbadas com sua mãe, com outras bailarinas de sua companhia e com o próprio diretor, Thomas (Vincent Cassel).

Os distúrbios de Nina são tão intensos que chegam a confundir o espectador. Aquilo que se vê de fato aconteceu dentro da narrativa ou foi apenas mais um delírio da personagem? Demoramos alguns segundos para identificar.

Cisne Negro é certamente um filme que tem mérito. Mas eu teria gostado bem mais se tivesse ouvido falar bem menos dele entes de ter assistido.

Os comentários que ouvi/li foram os mais diversos, mas quase todos giravam em torno de um mesmo eixo. “O filme é extremamente perturbador”, era a opinião majoritária. De tanto isso se repetir, imaginei que iria me deparar com um novo Réquiem por um sonho - filme do mesmo diretor, lançado de 2000. Este sim é extremamente perturbador e agressivo – tanto que, apesar de ter entendido a proposta, não me agradou muito o resultado final. E por achar que Cisne Negro adotaria uma postura tão contundente quanto Réquiem por um sonho, adiei ao máximo meu encontro com Natalie Portman e seu balé.

Ao final do filme, eu já não sabia se ele de fato não era perturbador ou se eu criei uma expectativa demasiadamente grande com base no que eu ouvi/li sobre o filme. De qualquer forma, cada dia concordo mais com a frase do Daniel Galera: “São as expectativas que fodem tudo”. 

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Uma trilogia de quatro livros

Quando se pensa em uma trilogia, por analogia, tem-se a ideia de três obras que compõem um conjunto maior. Esta é a definição mais convencional de todas. Mas nada em Fernando Gabeira é muito convencional.

Todo mundo sabe que não é de hoje que eu sou fascinado pela produção intelectual do Gabeira. Discordo dos críticos, que encerram a Trilogia de Depoimentos do nosso mineiro (sim, Gabeira nasceu em Juiz de Fora) em “Entradas e Bandeiras”. Só porque, diferente dos anteriores, “Hóspede da Utopia” é uma obra de ficção ele deixa de entrar na série? Não, eu não consigo concordar com isso. Mas vamos por partes.

Quando Gabeira volta do exílio, ele decide contar suas impressões sobre os três momentos que passou durante o período da Ditadura Militar. É aí que surge “O que é isso, companheiro?”, livro que inspirou o filme de Bruno Barreto. Nele, o autor conta seu primeiro desafio: como enfrentar o regime militar.


Um golpe militar é um pouco como uma grande e emocionante peça de teatro. Quando termina, você sente um grande impulso para estar junto das pessoas de quem gosta, ou mesmo telefonar para saber se estão bem.

O autor descreve – de forma bastante crítica, por sinal – o funcionamento e a organização dos grupos de esquerda que viviam na clandestinidade, o comportamento dos jovens marxistas, até chegar ao famoso sequestro do embaixador Charles Burke Elbrick. Daí até a cadeia. Da cadeia até o exílio – tema do segundo livro da série.

“O crepúsculo do macho” trata do período em que Gabeira foi parar no exílio. Como ficar quase 10 anos longe de seu país, sem informações sobre seus amigos e familiares? Como se integrar forçadamente à uma nova cultura, sem saber por quanto tempo terá que fazer parte daquela sociedade?

Ninguém será enganado: isto é uma viagem. Lembra-se dos filmes de bangue-bangue nos cinemas empoeirados do subúrbio? Lembra-se do momento em que a diligência ia ser atacada pelos índios? Era sempre num desfiladeiro. Cada vez que os cavalos pisavam a entrada do desfiladeiro, nossa angustia era precipitada pelos efeitos sonoros, anunciando que, a qualquer instante, a lona do carro seria crivada de flexas. Pois bem: é essa a angústia que sinto, quando entro na plataforma da estação central de Estocolmo.

Esta sequência de imagens é nada menos do que o primeiro parágrafo do livro. Pelo golpe inicial já dá para ter uma noção do tom angustiante que tomará conta de toda a narrativa. Mas, paralelamente a toda esta angústia, há contos e casos curiosos. Como na entrevista concedida por Gabeira.

O autor trabalhava como condutor de trem em Estocolmo. No réveillon, um grupo de jornalistas quis fazer uma matéria sobre pessoas que trabalham durante a madrugada e, consequentemente, passariam a virada do ano no trabalho – como condutores de trem e jornalistas, conforme exemplifica o autor, ironizando de suas duas ocupações. Chegando lá, os repórteres deram de cara não só com um trabalhador-da-madrugada, mas com um intelectual exilado político de um país de terceiro mundo que se tornara, por necessidade, um trabalhador-da-madrugada. E a entrevista se prolonga bem mais do que o previsto.

O tempo passa, o tempo voa, e a poupança Bamerindus continua numa boa e Gabeira ganha o direito de voltar ao Brasil, em 1979. Como voltar ao seu país após ficar quase 10 anos longe dele, sem informações sobre seus amigos e familiares? Quais as impressões sobre o novo país? Seria o mesmo que ele havia deixado para trás? São estas e outras perguntas que ele tenta responder em “Entradas e Bandeiras”.

“Entradas e Bandeiras”, na minha mais humilde opinião, é o melhor livro da série. Gabeira faz uma análise extremamente madura e bastante peculiar da sociedade brasileira no início dos anos 1980. Observa a ascensão do movimento ecológico, do movimento gay, as patrulhas ideológicas, os desmandos da esquerda. Se eu tivesse que escolher um único parágrafo para exemplificar toda a obra, seria o seguinte:

Culturas independentes como a dos negros exigiam um direito de existência. Os homossexuais, mantidos sob o signo do preconceito, começavam a se organizar em quase toda a parte. Os loucos, os velhos, as crianças, em breve iam abrir os olhos para o processo de opressão a que estavam submetidos. A sorte da nossa época dependia do proletariado. Seria ele capaz de captar essas novas tendências, ou embarcaria pura e simplesmente nas águas da repressão silenciosa e disfarçada contra milhões de seres humanos?

E com este livro, Gabeira encerra, para muitos críticos, sua trilogia de depoimentos. Mas discordo frontalmente desta marcação. Acredito que o quarto livro do autor se insere no mesmo campo dos demais. Apesar de ser uma obra de ficção.

É o “Hóspede da Utopia” que encerra os relatos de Gabeira sobre a ditadura. Nele, um casal errante busca da felicidade em sua forma mais plena. Uma história de amor, que tenta responder à pergunta formulada por Gabeira, assim que ele volta do exílio:

“Os políticos podem dar o balanço do número de mortos, do número de cassados, refugiados, banidos. Mas quem dará o balanço do medo dos projetos humanos que se frustraram, dos abraços que se negaram, dos beijos paralisados, tudo por medo? Quem dará o balanço do medo que nós tivemos?”

Desta forma, venho por meio deste post tentar corrigir um erro histórico – a idéia de que a Trilogia Série de Depoimentos do Gabeira tem apenas três livros. Há um quarto que, por trás de personagens fictícios, aparece um Fernando, que vai se revelando pouco a pouco nas entrelinhas de uma primorosa narrativa.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Um livro de ouro

Todo mundo sabe que eu admiro – e muito – o senador Cristovam Buarque (PDT-DF). Em 2006 participei de sua campanha à Presidência, mas só mais tarde tomei conhecimento de sua obra literária. E me fascinei logo de cara. Tanto que um dos capítulos do meu livro é exclusivamente sobre “Os Deuses Subterrâneos”. Agora venho falar sobre outro livro do Cristovam – este, de não-ficção – que também merece destaque: “A cortina de ouro”.



Cristovam nos presenteia com um livro simples e direto sobre os “sustos” do final do século XX e os desafios para o homem dos anos 2000. Publicado em 1995, a obra é basicamente a transcrição de uma conferência realizada pelo autor com o título de “Os sustos do final do século”.

Em suma, o raciocínio que se desenvolve é o seguinte: a partir das projeções feitas por artistas e intelectuais do século XIX de como seria o século XXI, Cristovam faz análises sobre o que de fato foi realizado e em que aspectos a sociedade ficou aquém da utopia criada por tais pensadores. A conclusão a que se chega é que, do ponto de vista técnico, a sociedade avançou enormemente – muito mais do que imaginado. Em contrapartida, a realidade social que se apresenta é ais devastadora do que as mais pessimistas projeções. Ou, nas palavras do autor, “o avanço técnico não serviu para construir uma sociedade utópica”.

Um belo exemplo usado pelo autor é o avanço da medicina. Há alguns séculos, não havia cura para grande parte das doenças. Tanto os ricos quanto os pobres pereciam dos mesmos males. Hoje, já há vacinas e tratamentos dos mais sofisticados. Mas seu uso, em muitos dos casos, é restrito apenas aos ricos – enquanto pobres ainda morrem sem tratamento.

Ainda no que diz respeito aos avanços técnicos no campo da medicina, Cristovam cita o transplante como outro bom exemplo para esta desigualdade entre avanço técnico e desenvolvimento social:

Ninguém acreditava, há cem anos, que antes do final do século XX o transplante seria uma prática comum na medicina. Muito menos que a desigualdade estaria tão acirrada, que crianças seriam traficadas, mortas, para que seus órgãos fossem transferidos a outras crianças.

O livro é de uma abordagem impressionante para um tema ao mesmo tempo tão delicado e relevante para todos aqueles que querem lançar um olhar mais crítico sobre o século XXI e seus desafios. A leitura é imprescindível. E não adianta alegar que está sem tempo para ler: são 120 páginas, divididas em capítulos curtos, dá para ler rapidinho.

Por fim, gostaria de incluir neste post mais uma passagem do livro:

Para assombro de muitos observadores do mundo das ideias e das ideias do mundo de hoje, Aristóteles ou Platão parecem explicar melhor com seus pensamentos simples a simplicidade da sociedade grega de sua época do que os sofisticados acadêmicos e cientistas sociais de hoje são capazes de explicar as sofisticadas economias e sociedades contemporâneas deste final do século. E todos os homens se assustam com esta constatação.

sábado, 5 de novembro de 2011

Frases fortes, narrativa entediante

A minha mais recente leitura foi um livro que estava na minha lista (sim, eu tenho uma lista de "próximas leituras") há alguns anos (pasme), mas só agora tive saco tempo de pegar para ler. E até que gostei. Em partes. Trata-se do Este lado do paraíso, do F. Scott Fitzgerald (lê-se “Fitzgérald”).

O livro, publicado em 1920, quando o autor tinha 24 anos, conta a história de Amory Blaine, “o egocêntrico romântico”, desde quando ele era uma criança mimada até a fase adulta, cheia de responsabilidades e cobranças. O personagem, como o próprio Fitzgerald admite, deixa transparecer muito sobre o autor. “Não gostaria de falar de mim, pois admito que já o fiz bastante neste livro”, diz no prefácio “Uma justificativa do autor”.


No todo, pode-se dizer que o romance é legal. Entre drinks e festas de universidade, os personagens nos presenteiam com frases fortes e pensamentos bastante marcantes. Aliás, este é um dos pontos altos do livro, que fazem compensar a narrativa lenta adotada pelo autor. Mas entre um tédio e outro, somos surpreendidos com algo do tipo:

“Se alguém não puder ser um grande artista ou um grande soldado, o melhor que lhe resta é ser um grande criminoso.”

Ou ainda:

“Não é que eu me incomode com esse brilhante sistema de castas”, confessou Amory. “Gsto de saber que os primeiros lugares cabem aos sujeitos alinhados, mas puxa vida, Kerry, tenho de ser um deles!”

Amory é um personagem que alterna entre a frivolidade e um profundo conhecimento artístico/literário. Em diversas passagens ele discute o valor de uma obra de arte com algum de seus amigos. Em outras, ele revela um desejo de pertencer às classes mais elevadas da hierarquia social de Princeton. No todo, acaba sendo um personagem bastante interessante.

As últimas passagens do livro fazem valer toda a leitura. São nas últimas páginas em que aparece a definição de Amory bastante peculiar para “classe média”:

“Estes homens de mentalidade mofada, que apenas alisaram os bancos escolares, que pensam que pensam cada questão que surge... bem, gente assim encontra-se em cada esquina. Num momento eles se manifestam sobre ‘a brutalidade e desumanidade desses prussianos’ e, logo em seguida, declaram que ‘deveríamos exterminar todo o povo alemão’. Estão sempre acreditando que ‘a situação, agra, não está nada bem’, mas eles ‘não têm qualquer fé nesses idealistas’. Num minuto afirmam que Wilson ‘não passa de um sonhador, não é nada prático’, e daí a um ano aderem a ele por ter tornado seus sonhos realidades. Não possuem ideias claras e lógicas sobre um único assunto, exceto uma posição retrógrada e insensível a qualquer mudança. Julgam que as pessoas sem instrução não deveriam ser bem pagas, mas não percebem que se não pagarem bons salários a essa gente seus filhos também não terão uma boa educação, o que nos leva a um círculo vicioso Essa é a famosa classe média.”

No todo, é uma leitura que oscila entre diálogos muito interessantes e trechos bastante arrastadas. Vale a leitura, pois é um retrato não só de um personagem, mas de toda uma geração.